Cursava
o curso de História pela UFAC, em 2003, e tivemos uma disciplina chamada
Metodologia da Pesquisa Histórica, com prof. Dr. Carlos Alberto Alves de Souza.
E a turma foi dividida em grupos para produzirem matérias relacionadas às
várias temáticas propostas e entre elas estava a de fazer um apanhado sobre a
história envolvendo os “Soldados da Borracha”, que participaram de um momento
importante da história do Acre. Buscamos entrevistar os nossos seringueiros e
em seguida fizemos a transcrição dos depoimentos e entregamos ao nosso
professor. Esse material feito por todos os grupos resultou em um livro
patrocinado pelo Instituto ENVIRA, no qual o Prof. Carlos Alberto era
presidente. No encerramento do Curso de História foi feito o lançamento do
nosso livro que se chamava “Uma História Social de Tarauacá – cultura e experiências
sociais”.
O
texto abaixo foi extraído desse livro e relata uma situação vivida pelos nossos
“Soldados da Borracha”. Como foram enganados tanto pelo governo federal como
por seus “aliciadores” para virem para a Amazônia, cortar seringa e cumprir um
acordo feito pelo governo com os países aliados na segunda guerra mundial.
“Sabe-se
que a máquina de propaganda ideológica (radio, jornal e outros meios de
comunicação do Brasil), com grande influencia dos norte-americanos (Estados
Unidos) e Ingleses, naquela época era bastante intensificada e até mesmo
exagerada, pois o que mostraram, segundo os “soldados da borracha”, era um
soldado bem vestido com farda verde do exercito e um fuzil do lado, pousando em
baixo de uma seringueira. Em outras circunstancia mostram dinheiro saindo do
caule de uma arvore do lugar do látex, na tentativa de fixar a ideia da riqueza
para os que viessem para a Amazônia. Só propaganda enganosa, visto que quando
aqui chegaram os seringueiros raramente recebiam algum material a não ser uma
simples faca para cortar seringa e uma espingarda para se defender dos animais
selvagens da floresta. Além de toda propaganda, o governo federal garantia que
os “Soldados da Borracha” seriam indenizados e aposentados quando a guerra
terminasse, alimentando a promessa de que na aposentadoria eles receberiam o
mesmo valor que um soldado do exercito, promessa que nunca foi cumprida. A maioria
das pessoas que vieram trabalhar nos seringais do Acre não teve grande apoio,
tanto por parte dos patrões quanto do governo federal.
Quando
os soldados da Borracha chegaram ao Acre, não tinham nenhum conhecimento de
como se “cortava” a seringa e fazia a borracha, tendo em vista que em suas
terras natais não tinham as mesmas características geográficas da Amazônia. O
Nordeste era completamente diferente do Acre. Os patrões precisavam ensinar os
seringueiros, um por um, a cortar e a colher o látex e fazer o processo de
defumação da borracha. É importante lembrar também, que face às dificuldades havia
as resistências. Os trabalhadores não suportavam todas as dominações e muitas
vezes fugiam, porém o seringalista também tinha
os seus pistoleiros que saíam em busca dos seringueiros para que fossem
trazidos de volta aos seus locais de trabalho.
Além
disso, a educação também se tornara um mecanismo muito importante contra a
dominação, uma vez que aquele seringueiro que não soubesse ler, raramente teria
saldo no acerto de contas, enquanto que os alfabetizados tornavam-se um “osso
duro de roer”. Dificilmente eram enganados. Fora disso, é importante salientar
ainda que quando os seringueiros viram que a sua produção, muitas vezes anual,
não estava superando suas expectativas, estes começaram a alterar a composição
das pelas de borracha. Segundo relatos, eles chegavam a colocar cachos inteiros
de cocos da palheira “jaci” da mata no interior da péla, ou até mesmo misturar
o barro com látex para a borracha se tornar mais pesada. Muitos nordestinos
vieram para o Acre com suas famílias outros ainda jovens vieram em busca de uma
nova vida. Cheios de expectativa esses jovens conseguiram casar-se com filhas
de outros seringueiros, mais para isso o pretendente teria que mostrar que era um
homem trabalhador. Havia festas tanto nos barracões quanto nas casas dos
seringueiros. Essas festas, mesmo sendo fraternas, estavam sujeitas às
presenças daqueles homens brabos que quando não eram convidados surgiam somente
para “acabar” a festa, e ali se formava aquela confusão. É importante lembrar
ainda que era mais comum festejar nos finais de ano e no período das fogueiras.
Muitos,
ou talvez a maioria de ex-seringueiros, vieram para a cidade porque com o fim
da Segunda Guerra Mundial, o látex da nossa região ficou muito desvalorizado. O
mercado norte americano abandonou a nossa produção e recuperou os seringais da
Malásia que tinha sido tomado do Japão. Assim como os seringueiros não tinha
para quem vender seus produtos, restou-lhes apenas sobreviver da agricultura ou
migrar para a cidade, alimentados pela ideia de conseguirem um novo emprego e
uma vida melhor. Mas tudo isso não passava de sonhos que as pessoas tinham com
relação às cidades, que, com a decadência da borracha sofreram um processo de
inchaço e contribuiu para um superpovoamento, surgindo assim às periferias e
consigo muitas preocupações administrativas”. (texto
produzido por Elivaldo Bandeira Coelho, Valdir Nery Piauhy, José de Souza
Costa, Asarias Oliveira, José Augusto Pires da Costa e Aldomi Albano Ponciano –
Curso de História, UFAC, 2003).
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