quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

O engodo do Governo Federal com os "Soldados da Borracha"



Cursava o curso de História pela UFAC, em 2003, e tivemos uma disciplina chamada Metodologia da Pesquisa Histórica, com prof. Dr. Carlos Alberto Alves de Souza. E a turma foi dividida em grupos para produzirem matérias relacionadas às várias temáticas propostas e entre elas estava a de fazer um apanhado sobre a história envolvendo os “Soldados da Borracha”, que participaram de um momento importante da história do Acre. Buscamos entrevistar os nossos seringueiros e em seguida fizemos a transcrição dos depoimentos e entregamos ao nosso professor. Esse material feito por todos os grupos resultou em um livro patrocinado pelo Instituto ENVIRA, no qual o Prof. Carlos Alberto era presidente. No encerramento do Curso de História foi feito o lançamento do nosso livro que se chamava “Uma História Social de Tarauacá – cultura e experiências sociais”.
O texto abaixo foi extraído desse livro e relata uma situação vivida pelos nossos “Soldados da Borracha”. Como foram enganados tanto pelo governo federal como por seus “aliciadores” para virem para a Amazônia, cortar seringa e cumprir um acordo feito pelo governo com os países aliados na segunda guerra mundial.




“Sabe-se que a máquina de propaganda ideológica (radio, jornal e outros meios de comunicação do Brasil), com grande influencia dos norte-americanos (Estados Unidos) e Ingleses, naquela época era bastante intensificada e até mesmo exagerada, pois o que mostraram, segundo os “soldados da borracha”, era um soldado bem vestido com farda verde do exercito e um fuzil do lado, pousando em baixo de uma seringueira. Em outras circunstancia mostram dinheiro saindo do caule de uma arvore do lugar do látex, na tentativa de fixar a ideia da riqueza para os que viessem para a Amazônia. Só propaganda enganosa, visto que quando aqui chegaram os seringueiros raramente recebiam algum material a não ser uma simples faca para cortar seringa e uma espingarda para se defender dos animais selvagens da floresta. Além de toda propaganda, o governo federal garantia que os “Soldados da Borracha” seriam indenizados e aposentados quando a guerra terminasse, alimentando a promessa de que na aposentadoria eles receberiam o mesmo valor que um soldado do exercito, promessa que nunca foi cumprida. A maioria das pessoas que vieram trabalhar nos seringais do Acre não teve grande apoio, tanto por parte dos patrões quanto do governo federal.
Quando os soldados da Borracha chegaram ao Acre, não tinham nenhum conhecimento de como se “cortava” a seringa e fazia a borracha, tendo em vista que em suas terras natais não tinham as mesmas características geográficas da Amazônia. O Nordeste era completamente diferente do Acre. Os patrões precisavam ensinar os seringueiros, um por um, a cortar e a colher o látex e fazer o processo de defumação da borracha. É importante lembrar também, que face às dificuldades havia as resistências. Os trabalhadores não suportavam todas as dominações e muitas vezes fugiam, porém o seringalista também tinha os seus pistoleiros que saíam em busca dos seringueiros para que fossem trazidos de volta aos seus locais de trabalho.

Além disso, a educação também se tornara um mecanismo muito importante contra a dominação, uma vez que aquele seringueiro que não soubesse ler, raramente teria saldo no acerto de contas, enquanto que os alfabetizados tornavam-se um “osso duro de roer”. Dificilmente eram enganados. Fora disso, é importante salientar ainda que quando os seringueiros viram que a sua produção, muitas vezes anual, não estava superando suas expectativas, estes começaram a alterar a composição das pelas de borracha. Segundo relatos, eles chegavam a colocar cachos inteiros de cocos da palheira “jaci” da mata no interior da péla, ou até mesmo misturar o barro com látex para a borracha se tornar mais pesada. Muitos nordestinos vieram para o Acre com suas famílias outros ainda jovens vieram em busca de uma nova vida. Cheios de expectativa esses jovens conseguiram casar-se com filhas de outros seringueiros, mais para isso o pretendente teria que mostrar que era um homem trabalhador. Havia festas tanto nos barracões quanto nas casas dos seringueiros. Essas festas, mesmo sendo fraternas, estavam sujeitas às presenças daqueles homens brabos que quando não eram convidados surgiam somente para “acabar” a festa, e ali se formava aquela confusão. É importante lembrar ainda que era mais comum festejar nos finais de ano e no período das fogueiras.

Muitos, ou talvez a maioria de ex-seringueiros, vieram para a cidade porque com o fim da Segunda Guerra Mundial, o látex da nossa região ficou muito desvalorizado. O mercado norte americano abandonou a nossa produção e recuperou os seringais da Malásia que tinha sido tomado do Japão. Assim como os seringueiros não tinha para quem vender seus produtos, restou-lhes apenas sobreviver da agricultura ou migrar para a cidade, alimentados pela ideia de conseguirem um novo emprego e uma vida melhor. Mas tudo isso não passava de sonhos que as pessoas tinham com relação às cidades, que, com a decadência da borracha sofreram um processo de inchaço e contribuiu para um superpovoamento, surgindo assim às periferias e consigo muitas preocupações administrativas”. (texto produzido por Elivaldo Bandeira Coelho, Valdir Nery Piauhy, José de Souza Costa, Asarias Oliveira, José Augusto Pires da Costa e Aldomi Albano Ponciano – Curso de História, UFAC, 2003).



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